Este é o mundo em que vivemos. As escolas dividem-se em
grupos e grupinhos, de pessoas fixes, cientistas e nerds, geeks, raparigas
lindíssimas viciadas em maquilhagem e roupa, rapazes skaters, os baldas, que
como podem calcular são os que nunca pisam o terreno escolar o ano todo. E
depois existem rapazes como eu. Eu sei que não sou o único no mundo, eu sei que
não devo ser o único no mundo com este problema, mas afecta-me viver assim, é
como se clicasse na pausa na vida e estivesse literalmente à espera para
conhecer o meu destino, como se estivesse na fila da cantina, mas o menu do dia
fosse o futuro, com sopa de legumes.
Um miúdo olha o céu, enquanto chove, enquanto todos gozam
com ele. A chuva molha os seus caracóis jovens e humedece a áspera mochila de linho.
Quase que me podia pôr na situação dele, sendo que não me arriscaria a passar
uma humilhação como a que ele está a passar, senão os mais velhos ainda me
batem por isso…
- Miguel! – Um rapaz mais velho bate-me nas costas
- Então, vais almoçar hoje? – Perguntou-me um rufia que não
reconheço, por detrás dele está Ricardo, o meu primo, rindo-se com mais dois
amigos, ouvindo a nossa conversa
Queria responder-lhe, mas a voz faltou, sinto picadas no
corpo inteiro, o medo corre-me nas veias
- Almoça connosco – Esse rufia, fazendo cara séria,
convida-me, enquanto os outros desatam a rir
- Um pouco de respeito pelo nosso caro convidado – Disse o
Rufia, sendo irónico, claro que entendo, não sou assim tão burro…
Sentando-me entre eles, eles roubam-me a sobremesa,
despenteiam-me o cabelo, despejam água na minha sopa e na minha comida. É
verdade que dói, mas que posso eu fazer senão conformar-me? Mais dois anos e
saio daqui, e aí serei livre. Deixarei para trás estas pessoas que não têm
vida, e apenas me darei com boas pessoas, simples e sinceras, sem necessidade
de serem superiores a ninguém.
- Oh Miguel, não comeste nada hoje – Disse a empregada,
olhando para o meu tabuleiro
- E esta água? – Perguntou-me
- Ao ir à pasta cotovelei o copo e enchi o prato de água sem
querer – Menti
- Tem cuidado para a próxima – Pousei o tabuleiro
Ouvem-se risos, e eu sei que são para mim. Lágrimas batem
nos recantos dos olhos, mas homens não choram, os homens nunca choram.
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